Objetos Narrativos

Já tem quase quatro anos que eu venho desenvolvendo artefatos para jogos de Escape Room, mas tem pra mais de vinte anos que eu pesquiso essa possibilidade de transformar um objeto comum, conhecido e com um funcionamento previsível, numa surpresa completa. Dá um trabalhão em termos de projeto!

Na minha época de faculdade eu fiz um espetáculo chamado “Frio 36 e Meio C”, com Arthur Belloni, Laís Marques e Helena Cerello. Era a retomada de “Mesmo sem ter culpa de nada, o frio é de matar”, que eu, Arthur, Gláucia Felipe, Kelly e depois Patrícia Zuppi fizemos e que ganhamos o curta Teatro lá no Sesi Sorocaba, em 1996. Ali eu comecei a brincadeira com efeitos especiais no teatro.

Na época não tinha essa moleza de Arduíno, Raspberry Pi, tudo isso. Eu fiz uma mala que reproduzia uma música do Phillip Glass, usando um player de CD com MP3, amplificador e bateria. Essa mesma mala foi usada em “Frio 36 e Meio”, assim como outros mil efeitos que eram uma loucura de manter e consertar…

Vez ou outra eu acabo inventando alguma coisa do gênero. Mas quando eu descobri os Escape Rooms através do Henrique Sitchin (Truks e Escape Junior), eu vi um terreno enorme para trabalhar.

Muitos escapes que estão rodando no mercado já possuem seus criadores de puzzles e artefatos. Então muitas vezes eu acabei me aproximando desses escapes para fazer manutenção de objetos que outras pessoas criaram. Com isso, eu fui vendo o que funcionava, o que não funcionava. Aprendi muito com os meus próprios erros, mas aprendi também com os erros dos outros. O mundo do Arduino permite que qualquer um faça uma busca na Internet e encontre um código pronto e diagramas completos para qualquer tipo de coisa que você imaginar. E se você quiser, pode entrar em sites como Alibaba e BangGood e encontrar mil coisas já prontas para usar no seu Escape Room.

O negócio é que quando você joga muito vai adquirindo um repertório de puzzles. E o que vai fazendo a diferença de um Escape para o outro é o modo como o Puzzle está ligado à narrativa da sala. Às vezes numa mesma empresa nós temos salas que são fantásticas e outras que são lamentáveis. O realismo das coisas nem importa tanto! Eu achava que sim no começo. Porque eu faço a manutenção na sala com ela vazia, sem ninguém jogando. E sou pago para ver problemas. Então eu me desapontava com a qualidade da arte de alguns Escapes. Mas quando você joga, você só se preocupa com o tempo e em resolver os enigmas. Aquele fio passando ali? Deixa pra lá.

Lógico que quando eu jogo eu sigo os cabos, né? Daí eu descubro onde está o mecanismo que vai abrir aquela porta. Mas acho que isso todo mundo faz…

O que acontece comigo é que quando eu entro numa sala de Escape parece que eu tenho visão de Raio X. Eu já vi tanta coisa, já li tanto código, que quando eu vejo um Puzzle imediatamente eu reconheço. Tem uns casos em que eu já até sei qual o tipo de problema que vai rolar. Porque aquela solução que está na sala para ser jogada é um código que foi copiado de alguém que estava estudando aquele sensor, aquele sistema… Ainda estava em prototipagem. Tinha limites.

Em 2017 eu peguei uma sala inteira controlada por um Arduino Mega, com a placa no shape padrão. Todas as conexões do sistema estavam feitas com fios CAT5 ou CAT5E (cabos de rede) descascados e enfiados no conector fêmea. Em alguns casos, cheios de zinabre (oxidação). O mesmo sistema controlava todas as fitas de LED da sala, os efeitos sonoros, acionava um player de vídeo numa Raspberry Pi no outro cômodo. Mas o pior de tudo era o MULTI-RFID. Esse daí foi uma dor de cabeça lascada.

Esse código aqui: https://www.arduinoplatform.com/arduino-project/rfid-door-lock-with-multiple-rfid-readers-for-arduino/ e suas varíaveis (procure na própria biblioteca do leitor RC522 o exemplo Multi-RFID) tem mil problemas que são inclusive comentados no código original.

O exemplo usa três, quatro rfids, montados numa plaquinha de prototipagem com fios curtos, tudo bem pertinho. Agora imagine colocar um Arduino Mega de um lado e as cinco RFIDs do outro lado de uma tumba de MDF com 10mm. Não vai funcionar. O protocolo SPI não foi feito para comunicação à grande distância. Eu estudei a beça na época e até descobri esse pdf que trata desse assunto: https://www.ti.com/lit/an/slyt441/slyt441.pdf. Ponto final. Pode até ser que funcione durante algum tempo, mas depois vai dar problemas.

Essa empresa tinha duas unidades com o mesmo jogo. Numa das unidades, foi possível deixar o sistema mais organizado e estável. Na outra… Impossível! Eu trabalhei por duas semanas e não consegui resolver de jeito nenhum. Lógico que existem outras soluções para esse problema, mas isso implica em realizar um novo projeto. E eu estava sendo contratado para consertar algo.

Semana passada eu terminei uma versão desse mesmo tipo de puzzle. Toda vez que você quer fazer um quebra-cabeça em que o jogador precisa colocar os objetos numa ordem correta, nos lugares corretos, etc, você usa esse mesmo sistema. Cada objeto tem uma TAG com um código único. E o lugar onde o objeto vai ser colocado tem um Leitor de RFID que quando reconhece aquele código, diz que está ok. O número de objetos vai determinar também o número de leitores. E eu nunca tinha conseguido ir além de 5. Mas o meu puzzle tem oito! Eu fiz uma versão daquele quebra cabeças em que você precisa ir deslizando as peças num quadrado para colocar em ordem uma sequência numérica ou desenho.

Isso aqui:

O sistema é razoavelmente estável com os oito Leitores de RFID. Mas ainda assim, não é confiável. Ainda preciso realizar testes com uma fonte de maior amperagem. E aí vou postar os resultados.